Eduardo Uram
Empresário analisa a crise do futebol

"Hoje, o futebol, efetivamente, não é um bom negócio". A afirmação é do empresário Eduardo Uram, diretor-presidente da Brazil Soccer, empresa de marketing esportivo que presta consultoria para clubes e jogadores, como Váldson (Flamengo), Leonardo (São Paulo) e Allan Delon (Vitória). Eduardo concedeu entrevista ao PortalBARRA em seu escritório, no shopping Città América, em que analisou a crise financeira pela qual os clubes brasileiros passam e suas perspectivas de recuperação.

 
 

PortalBARRA:A maioria dos clubes brasileiros vive uma grave crise financeira. O futebol é um bom negócio?

Eduardo Uram: Todo negócio tem períodos de bonança e períodos de crise. Nós estamos passando por um período de crise mas, quando você monta um negócio, tem que fazer um projeto de médio e longo prazo. Hoje em dia, o futebol, efetivamente, não é um bom negócio. Mas numa perspectiva de médio e longo prazo, é a maior indústria de entretenimento do mundo. A gente vive, hoje, um momento de reestruturação econômica do futebol. Ele começou com a quebra da Kirsh, que era a maior empresa alemã de marketing esportivo e detinha os direitos de transmissão do campeonato alemão. As TVs passaram a ter dificuldade para vender os campeonatos aos anunciantes e a não comprar os direitos de transmissão dessas empresas. Isso desencadeou uma crise em empresas de marketing esportivo - como a ISL, que tinha parceria com o Flamengo - o que fez cair muito o valor dos direitos de televisionamento dos campeonatos, fonte de renda dos clubes, que tiveram o orçamento reduzido. Só que os clubes tinham compromissos de 3 ou 4 anos baseados no orçamento anterior à crise. Os clubes trabalharão no vermelho até que esses contratos acabem. Então, o que nós temos hoje é um downgrade dos números. A partir do momento em que estiverem todos adaptados aos novos valores, voltará a se estabelecer um fluxo normal de negócios.

 
 

PortalBARRA:Muitas pessoas se impressionam com os salários ganhos pelos jogadores e pelos profissionais do futebol. Pode-se dizer que havia uma supervalorização de valores?

Eduardo Uram: Não porque os valores estavam adequados àquela realidade, ou seja, às receitas dos clubes. Não é normal que uma Julia Roberts cobre milhões para estrelar um filme. Mas é normal se avaliarmos o lucro que o filme vai ter em bilheteria, locação de fitas, entre outros, por conta da presença dela. Logo, o preço é justo. Agora, se o filme não vender tanto e tiver 50% de prejuízo, significa que ela está supervalorizada. No filme seguinte, vão ter que reduzir o cachê dela. O que fez a Kirsh pagar rios de dinheiro pelos campeonatos foi a presença do David Bechham, do Ronaldinho, do Rivaldo. Então, como grandes estrelas, eles têm que levar o seu quinhão. A partir do momento que as TVs não conseguiram mais vender os torneios por aqueles valores, eles tiveram que se adequar a essa nova realidade. Essa adequação é o que se chama de crise.

 
 

PortalBARRA: Qual é a saída para que os clubes saiam dessa crise?

Eduardo Uram: Não existe uma solução por si só. É necessária uma recuperação de credibilidade. Algumas medidas já estão sendo tomadas. Restrição e controle orçamentários, por exemplo. Nos campeonatos europeus, o clube que termina a temporada devendo dinheiro aos jogadores, não consegue se inscrever na temporada seguinte. Aqui, o cara gasta mais do que pode e rola a dívida. Então, é preciso estabelecer regras mais claras. Feito isso, terá que ser feito um ajuste que passará obrigatoriamente por uma renúncia de tributos fiscais e previdenciários por parte do governo. Sem isso, será impossível que os clubes façam frente às suas dívidas.

 
 

PortalBARRA:Em termos de qualidade técnica, o Campeonato Brasileiro não deixa nada a desejar. Há possibilidade de termos, um dia, um campeonato valorizado como os europeus?

Eduardo Uram: Em primeiro lugar, estamos em um país de terceiro mundo, de poder aquisitivo baixo. Você não pode contar aqui com renda de bilheteria, com venda de pay-per-view, etc. Essa é a primeira dificuldade. Você tem que competir com os salários oferecidos em dólares pelos clubes europeus aos nossos astros. Aqui, temos bilheteria negativa, a maioria dos clubes não tem patrocinador de camisa... Os números do futebol aqui são pequenos. O modelo do nosso futebol é exportador. Temos jogadores medianos atuando aqui. Os melhores são vendidos. Isso, entre outras coisas, faz com que seja mais difícil vender o Campeonato Brasileiro lá fora. É difícil ver um jogo do Brasileiro passar num canal a cabo internacional como vemos os campeonatos europeus. Não é um campeonato interessante em função do pequeno número de estrelas, da desorganização, da falta de critérios para definir o campeão.

 

PortalBARRA: Então, não depende da qualidade dos jogadores mas do prestígio deles...

Eduardo Uram: Você vai escolher um filme para ver. Um tem a Julia Roberts e o outro tem o Zé das Couves. Você vai escolher qual? O da Júlia Roberts. Mesmo que o Zé das Couves seja um grande ator. Quem liga a televisão quer ver o Beckham, o Ronaldo, o Rivaldo.

 

PortalBARRA: Por que a crise nos clubes do Rio é mais grave do que nos de São Paulo?

Eduardo Uram: Porque os de São Paulo são mais bem administrados, porque São Paulo é uma praça melhor do que o Rio, não só para o futebol como para qualquer coisa. Vai na Fórum do Rio Sul e na do shopping Iguatemi. A loja do Iguatemi é dez vezes maior. O Campeonato Paulista é mais bem organizado e a federação paulista é mais bem administrada que a carioca. Politicamente, as coisas aqui são mais complicadas.

 

PortalBARRA: Como você vê o crescente envolvimento de dirigentes de futebol com a política?

Eduardo Uram: O futebol dá uma notoriedade muito grande para as pessoas e muita gente usa isso para objetivos pessoais.

 

PortalBARRA: Esses objetivos pessoais não fazem com que esses dirigentes deixem o clube em segundo plano?

Eduardo Uram: Acho que o conflito de interesses se dá no momento de tomar decisões. Esses dirigentes podem tomar decisões populistas, que vão gerar votos para eles e que não são necessariamente as decisões que um gestor de clubes tomaria empresarialmente.

 

PortalBARRA: Como você avalia a administração da CBF?

Eduardo Uram: A CBF desempenha uma função, a organização do Campeonato Brasileiro, que não é dela. A meu ver, a CBF deveria ser uma espécie de cartório para registrar contratos, promover transferências, além de administrar as seleções brasileiras de base e principal. O campeonato deveria ser organizado por uma liga de clubes, o que deverá acontecer em breve.

PortalBARRA: Muitos empresários e jogadores têm comprado clubes pequenos. O que impede essas pessoas de comprarem clubes grandes e o que interessa nos clubes pequenos?

Eduardo Uram: Os clubes estão se adaptando ao novo modelo de clube/empresa. A partir do momento que se tornam sociedades anônimas, podem ter um dono. No Vitória da Bahia é assim. É uma empresa com ações como qualquer outra; 49% pertencem ao antigo clube e 51%, a um fundo argentino chamado Excel. O clube não tem um presidente mas um executivo, o que garante uma estabilidade de gestão. Os empresários que compram clubes pequenos, o fazem por uma questão de limite de orçamento. Seria muito melhor ter o Flamengo do que o XV de Piracicaba. Mas o Flamengo não está ao alcance de qualquer um.

PortalBARRA: Apesar de não sediar nenhum grande clube ou ter um estádio, a Barra é o bairro preferido de jogadores, abriga vários escritórios ligados ao futebol e, agora, também a sede da CBF. Por que o futebol gosta tanto da Barra?

Eduardo Uram: A Barra é um bairro muito agradável. Quem não gosta da Barra? Acho difícil a Barra sediar um grande clube mas o bairro deve concentrar toda a parte administrativa do futebol num futuro próximo.

 
 
 
 



 

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